OBRIGADO POR SUA HISTÓRIA

quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

PÁGINA DE CRÔNICAS DE JIDDU SALDANHA.





Pessoas de Caem do Céu

Passei boa parte do dia tentando amarrar cordas de náilon num gigantesco pedaço de plástico até juntar as quatro partes do mesmo e amarrar num cinto de pneu em forma de “X”. Tudo no meu tórax. Fiz alguns ensaios correndo pra lá e pra cá, medi o pé direito da casa como se fosse um especialista e concluí que a altura era boa para o primeiro salto do mais jovem pára-quedista da historia: Eu.
30 anos antes de meu grande salto, em 1944, mais precisamente no dia 05 de junho, os aliados jogaram sobre a cabeça dos alemães uma força de elite com 18 mil pára-quedistas que caíram silenciosamente do céu em diversas localidades da Normandia, França, com o objetivo de atacar os inimigos de dentro de seu próprio território, desarticulando-os para que, no dia 06, acontecesse o desembarque nas praias com soldados vindos da Grã Bretanha pelo mar. Eles chegavam em embarcações de todo tipo. Este dia ficou conhecido na história como o dia “D”.
Em 1974, meu pai estava muito preocupado e com um problemão pra resolver:
- Desce daí meu filho.
Em cima do telhado eu via o céu azul, sentia o vento e mirava o matagal à minha frente. Seu Hilário argumentava.
- A altitude é baixa, não vai abrir. Você vai quebrar a perna!
- Não vou não, pai, eu já treinei.
- Treinou errado, meu filho. Os pára-quedistas treinam em lugares altos, lá no Rio de Janeiro que é cheio de montanhas intercaladas de campos abertos e vastos e um vento quentinho, do jeito que o pára-quedas gosta. Você já viu alguma montanha em Curitiba? E o vento aqui é gelado, filho.
- Pai, você não está entendendo, eu sou o menor pára-quedista do Brasil, o primeiro com menos de 10 anos de idade, isto é um acontecimento histórico – embora não tenha dito isso desta forma, ficou clara a intenção.
- É, meu filho, com certeza você é um pioneiro, mas desce daí que te ensino a fazer um pára-quedas de brinquedo, igual aos que eu brincava quando tinha a tua idade.
- É mesmo?
Desci imediatamente apoiando-me pelas vigas do barraco.
Em 1962, o pára-quedista russo Eugene Andreev bateu todos os recordes de altura num salto com mais de 25 mil metros e que até hoje nunca foi superado. A brigada pára-quedista brasileira foi para o Egito em 1957 e ficou lá por quase 10 anos apoiando as nações unidas a manter a “paz” na região de Suez. Meu pai me ensinou a fazer para quedas com plástico e uma pedrinha amarrada embaixo, na base onde se encontravam os oito fios de barbante.
O pára-quedas foi o meu melhor brinquedo da infância.
Dizem que os filhos e filhas dos pára-quedistas nascem sorrindo por causa do friozinho na barriga que suas mães sentem a cada manhã de despedida, pois sabem que, naquele dia, alguém literalmente vai cair do céu, realizando  poderosos saltos, mas desta vez, da altura certa e com total segurança, embora, num rigoroso treinamento militar, ou numa deliciosa brincadeira esportiva.
Eu nunca saltei de pára-quedas.
Mas meu pensamento voa quando vejo fotografias de pessoas que "caem" do céu.

Jiddu Saldanha
11.06.2011




Sobre o Suicídio de Artistas!

Chaplin, em sua biografia, conta dos artistas que começaram a se suicidar por volta de 1912. Artistas que ficaram desesperados quando perceberam que o surgimento do cinema fez nascer um conceito de mito, de fama, muito diferente do que estavam acostumados! Tenho ouvido discursos semelhantes de vários colegas, alguns estão considerando a possibilidade do suicídio, por se julgarem inúteis e mal encaixados num mundo globalizado e rápido, como é hoje em dia!
Há aqueles que estão migrando para outras profissões e passaram a acreditar que realmente não é possível viver de arte, principalmente nos tempos atuais, onde o conceito de mito e celebridade passou a exigir cada vez mais um apelo imediato e de total empatia com o público numa velocidade recorde.
A depressão, o medo, a angústia e a solidão tem sido uma constante na nossa profissão, sobretudo um sentimento de inutilidade e um certo vazio causado pela profunda falta de esperança. Há o medo de chegar à velhice sem qualquer cobertura do estado e/ou uma garantia de descanso depois de uma vida de trabalho. Alguns sentem medo de perder seus companheiros ou companheiras, por não conseguirem uma forma digna de prover o sustento e dar garantias para a família.
Esses fantasmas sempre existiram na vida do artista. Se hoje vivemos uma pressão econômica maior, em tempos outros, era bem difícil lidar com o TABU da profissão. Atualmente o artista é depreciado, amado e é mais aceito na sociedade de consumo! Não vejo o Suicídio como uma saída para ninguém embora respeite o conjunto de crenças filosóficas que justificam muito bem esta saída “honrosa” da vida dura e causticante desses dias que vivemos.
É saudável manter um tom otimista e trabalhar um pouco a cada dia para mudar  nossa condição mas é importante ter consciência de que o conceito de mito e poder, hoje em dia, é bem diferente da época do Chaplin ainda que as perguntas persistam:
Afinal, o que é ser, de fato, um bom artista?
O que é preciso para sentir-se feliz sendo artista?

Jiddu Saldanha
03/06/2011


Sobre Sonhos e Vaias.

Assistindo a um documentário sobre os festivais de música da antiga Record, famosos pelas vaias a artistas da MPB, pensei em minha humilde carreira... Sim, já fui vaiado, não poucas vezes! A Vaia é um componente importante numa carreira artística, nos dá a nítida noção de que não existe piedade quando nos expomos. O público não está ali para ser bom ou mau. Público é público e pronto!
Uma vez um colega de profissão me disse: “Imagina cara, a galera paga uma grana pra te assistir e, de repente, você derrapa no palco... tem mais é que ser vaiado mesmo. Se tem coisa que respeito é a vaia do público”! “Eu também” - respondi ao meu amigo- “mas que dói isso, dói”.
Receber um uuuuhhh coletivo não é tão simples assim, principalmente quando você vê seus amigos saindo de fininho do teatro, em sinal de respeito, só para não confrontar a tua solidão. Para lidar com esta “desgraça” cunhei a frase: “Artista não tem sucesso e nem fracasso, artista tem biografia”!
Esta frase me consolou muitas vezes e, cá com meus botões, ouvir o burburinho da platéia extasiada tirando fotografia nos corredores, te mandando ramalhete de flores no camarim com cartão e tudo, isso sim é uma boa biografia.
Dito isto, concluo que, viver, no dizer de Guimarães Rosa, “é muito perigoso”, e viver como artista pressupõe que a vaia está na perspectiva. Acho que as únicas pessoas que desfrutam, também, deste “privilégio existencial” são os políticos e os professores: Os primeiros porque ganham muito e não fazem “nada”, os últimos porque vieram ao mundo para expiar os pecados de toda uma cultura falida, em uma sociedade acorrentada por questões meramente relacionais.

Jiddu Saldanha
05/06/2011

3 comentários:

  1. Mis saludos y felicitaciones desde Santiago de Chile, un gusto verle siempre activo y creativo, un estimulo para Brasil y el mundo entero!

    Leo Lobos

    ResponderExcluir
  2. "O mundo inteiro é um palco, e todos os homens e todas as mulheres são apenas atores" Shakespeare

    Adorei as crônicas!
    Jane

    ResponderExcluir

Liberdade de expressão!