Pessoas de Caem do Céu
Passei boa parte do dia tentando amarrar cordas de náilon num gigantesco pedaço de plástico até juntar as quatro partes do mesmo e amarrar num cinto de pneu em forma de “X”. Tudo no meu tórax. Fiz alguns ensaios correndo pra lá e pra cá, medi o pé direito da casa como se fosse um especialista e concluí que a altura era boa para o primeiro salto do mais jovem pára-quedista da historia: Eu.
30 anos antes de meu grande salto, em 1944, mais precisamente no dia 05 de junho, os aliados jogaram sobre a cabeça dos alemães uma força de elite com 18 mil pára-quedistas que caíram silenciosamente do céu em diversas localidades da Normandia, França, com o objetivo de atacar os inimigos de dentro de seu próprio território, desarticulando-os para que, no dia 06, acontecesse o desembarque nas praias com soldados vindos da Grã Bretanha pelo mar. Eles chegavam em embarcações de todo tipo. Este dia ficou conhecido na história como o dia “D”.
Em 1974, meu pai estava muito preocupado e com um problemão pra resolver:
- Desce daí meu filho.
Em cima do telhado eu via o céu azul, sentia o vento e mirava o matagal à minha frente. Seu Hilário argumentava.
- A altitude é baixa, não vai abrir. Você vai quebrar a perna!
- Não vou não, pai, eu já treinei.
- Treinou errado, meu filho. Os pára-quedistas treinam em lugares altos, lá no Rio de Janeiro que é cheio de montanhas intercaladas de campos abertos e vastos e um vento quentinho, do jeito que o pára-quedas gosta. Você já viu alguma montanha em Curitiba? E o vento aqui é gelado, filho.
- Pai, você não está entendendo, eu sou o menor pára-quedista do Brasil, o primeiro com menos de 10 anos de idade, isto é um acontecimento histórico – embora não tenha dito isso desta forma, ficou clara a intenção.
- É, meu filho, com certeza você é um pioneiro, mas desce daí que te ensino a fazer um pára-quedas de brinquedo, igual aos que eu brincava quando tinha a tua idade.
- É mesmo?
Desci imediatamente apoiando-me pelas vigas do barraco.
Em 1962, o pára-quedista russo Eugene Andreev bateu todos os recordes de altura num salto com mais de 25 mil metros e que até hoje nunca foi superado. A brigada pára-quedista brasileira foi para o Egito em 1957 e ficou lá por quase 10 anos apoiando as nações unidas a manter a “paz” na região de Suez. Meu pai me ensinou a fazer para quedas com plástico e uma pedrinha amarrada embaixo, na base onde se encontravam os oito fios de barbante.
O pára-quedas foi o meu melhor brinquedo da infância.
Dizem que os filhos e filhas dos pára-quedistas nascem sorrindo por causa do friozinho na barriga que suas mães sentem a cada manhã de despedida, pois sabem que, naquele dia, alguém literalmente vai cair do céu, realizando poderosos saltos, mas desta vez, da altura certa e com total segurança, embora, num rigoroso treinamento militar, ou numa deliciosa brincadeira esportiva.
Eu nunca saltei de pára-quedas.
Mas meu pensamento voa quando vejo fotografias de pessoas que "caem" do céu.
Jiddu Saldanha
11.06.2011
Sobre o Suicídio de Artistas!
Chaplin, em sua biografia, conta dos artistas que começaram a se suicidar por volta de 1912. Artistas que ficaram desesperados quando perceberam que o surgimento do cinema fez nascer um conceito de mito, de fama, muito diferente do que estavam acostumados! Tenho ouvido discursos semelhantes de vários colegas, alguns estão considerando a possibilidade do suicídio, por se julgarem inúteis e mal encaixados num mundo globalizado e rápido, como é hoje em dia!
Há aqueles que estão migrando para outras profissões e passaram a acreditar que realmente não é possível viver de arte, principalmente nos tempos atuais, onde o conceito de mito e celebridade passou a exigir cada vez mais um apelo imediato e de total empatia com o público numa velocidade recorde.
A depressão, o medo, a angústia e a solidão tem sido uma constante na nossa profissão, sobretudo um sentimento de inutilidade e um certo vazio causado pela profunda falta de esperança. Há o medo de chegar à velhice sem qualquer cobertura do estado e/ou uma garantia de descanso depois de uma vida de trabalho. Alguns sentem medo de perder seus companheiros ou companheiras, por não conseguirem uma forma digna de prover o sustento e dar garantias para a família.
Esses fantasmas sempre existiram na vida do artista. Se hoje vivemos uma pressão econômica maior, em tempos outros, era bem difícil lidar com o TABU da profissão. Atualmente o artista é depreciado, amado e é mais aceito na sociedade de consumo! Não vejo o Suicídio como uma saída para ninguém embora respeite o conjunto de crenças filosóficas que justificam muito bem esta saída “honrosa” da vida dura e causticante desses dias que vivemos.
É saudável manter um tom otimista e trabalhar um pouco a cada dia para mudar nossa condição mas é importante ter consciência de que o conceito de mito e poder, hoje em dia, é bem diferente da época do Chaplin ainda que as perguntas persistam:
Afinal, o que é ser, de fato, um bom artista?
O que é preciso para sentir-se feliz sendo artista?
Jiddu Saldanha
03/06/2011
Sobre Sonhos e Vaias.
Assistindo a um documentário sobre os festivais de música da antiga Record, famosos pelas vaias a artistas da MPB, pensei em minha humilde carreira... Sim, já fui vaiado, não poucas vezes! A Vaia é um componente importante numa carreira artística, nos dá a nítida noção de que não existe piedade quando nos expomos. O público não está ali para ser bom ou mau. Público é público e pronto!
Uma vez um colega de profissão me disse: “Imagina cara, a galera paga uma grana pra te assistir e, de repente, você derrapa no palco... tem mais é que ser vaiado mesmo. Se tem coisa que respeito é a vaia do público”! “Eu também” - respondi ao meu amigo- “mas que dói isso, dói”.
Receber um uuuuhhh coletivo não é tão simples assim, principalmente quando você vê seus amigos saindo de fininho do teatro, em sinal de respeito, só para não confrontar a tua solidão. Para lidar com esta “desgraça” cunhei a frase: “Artista não tem sucesso e nem fracasso, artista tem biografia”!
Esta frase me consolou muitas vezes e, cá com meus botões, ouvir o burburinho da platéia extasiada tirando fotografia nos corredores, te mandando ramalhete de flores no camarim com cartão e tudo, isso sim é uma boa biografia.
Dito isto, concluo que, viver, no dizer de Guimarães Rosa, “é muito perigoso”, e viver como artista pressupõe que a vaia está na perspectiva. Acho que as únicas pessoas que desfrutam, também, deste “privilégio existencial” são os políticos e os professores: Os primeiros porque ganham muito e não fazem “nada”, os últimos porque vieram ao mundo para expiar os pecados de toda uma cultura falida, em uma sociedade acorrentada por questões meramente relacionais.
Jiddu Saldanha
05/06/2011
Mis saludos y felicitaciones desde Santiago de Chile, un gusto verle siempre activo y creativo, un estimulo para Brasil y el mundo entero!
ResponderExcluirLeo Lobos
"O mundo inteiro é um palco, e todos os homens e todas as mulheres são apenas atores" Shakespeare
ResponderExcluirAdorei as crônicas!
Jane
Bravo!
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